Nos anos que morei em Londres, eu acabei me casando com um inglês. Casamento estando no exterior é bem diferente de um casamento quando estamos no nosso país de origem.
Independente se você casou no exterior com um gringo, com um brasileiro, se casou no Brasil e depois foi pro exterior, o importante é que, a consequência disso, na maioria das vezes, é uma pessoa perdida depois de um tempo.
Nos envolvemos muito nesse casamento, e doamos muito de quem somos e de quem queremos ser, a essa pessoa. Nos esquecemos do que gostamos, do que nos molda, do que precisamos, e damos um enorme espaço pro outro.
É claro que isso pode acontecer em qualquer casamento, em qualquer lugar do mundo. Muitas pessoas se perdem em casamento. Mas, sendo uma pessoa expatriada, isso se torna um pouco mais tenebroso. Parece que dependemos ainda mais daquela pessoa, que precisamos ainda mais dela, como se ela fosse nosso único vínculo naquele lugar. Seria diferente se estivéssemos perto da nossa família. Tanto que, muitas pessoas que casam no Brasil e depois vão pro exterior, comentam comigo como foi o impacto e a mudança da vida matrimonial depois disso.
Num piscar de olhos, estamos vivendo muito mais da vida do outro do que a nossa. O cônjuge gosta de praia então vamos ao mar apesar de eu não gostar. O cônjuge gosta de passar o domingo em casa então ficamos por lá mas na realidade eu gosto de ficar algumas horas no parque. Gosto de sair com minhas amigas mas meu cônjuge prefere que seja só nós dois. E por aí vai. Nos perdemos pelo caminho do casamento no exterior, e, quando nos damos conta, não vivemos a vida que gostaríamos.
Não preciso nem dizer como isso é um desgaste pro casamento. Nos perdermos com o mix das dificuldades do dia-a-dia, os boletos pra pagar, a comida pra fazer, a louça pra lavar, e o trabalho estressante. Tudo isso acaba sendo uma injeção letal pra nossa história a dois.
O grande reencontro
Aqui, você tem duas opções: ou você continua vivendo a vida do outro e sendo infeliz, ou você aprende a se amar novamente e a reconhecer suas próprias necessidades.
Se encontrar dentro disso é um ato de muita coragem. Descobrir novamente o que é importante pra você, o que te motiva e te move, é assustador. Quem você será depois de percorrer o caminho do autoconhecimento? Quem tá ali do outro lado do espelho?
Se você se perdeu por conta do seu casamento, e está no exterior, deixando pra trás muito daquilo que era importante pra você, essa será uma jornada mais árdua que qualquer outra, pois será solitária Não existe a possibilidade de ir pra casa da mamãe rapidinho enquanto você se redescobre. Você tá trancada no mundo do outro enquanto faz isso, o que torna tudo um pouco mais desafiador. Porém, não é impossível.
Me lembro bem da realização da perda de momentos que eu estava tendo por conta do meu marido. Foi duro perceber que eu não estava vivendo tudo que eu gostaria. Mas, fui me abrindo e me dando espaço, voltando a eixos que me equilibrava. Refleti sobre o que era importante pra mim e como ter mais disso na minha vida, e fui em busca disso.
É preciso se reencontrar. Ninguém é feliz o tempo todo mas, definitivamente, felicidade não é pra ser em frasco de conta gota. É pra ter mais momento feliz que triste. E, pra isso, você precisa se questionar, se abrir pro que está fechado aí dentro de você. Autoconhecimento é a melhor opção.
Tem como sobreviver após o reencontro?
Nem todo casamento sobrevive a essa mudança. Tenho alunos e amigas que, mesmo depois de anos de casados, quando se viu perdido dentro do casamento e foi ao reencontro de si, acabou não encontrando no parceiro aquilo que estava em busca. O estilo de vida não era o mesmo, a forma de pensar e agir perante ao mundo não era a mesma.
Mas, é claro, tem como sobreviver. Alguns casais acabam entrando nessa jornada juntos, o que ajuda no crescimento dos dois, e pode ajudar nesse equilíbrio do ser. É a melhor forma de se redescobrir pois você compartilha com o outro tudo que está mudando.
Por experiência, se uma pessoa do casal entra na jornada de descobrimento próprio, e o outro opta por se fechar a isso, a tendência é estremecer o casamento, quiçá até terminar. Muitos cônjuges ficam com raiva dessa mudança, afinal de contas, tudo estava indo bem no mundo dessa pessoa, pois tudo ia de acordo com o que ela queria e precisava, ela era o núcleo. De repente, ela teve isso cortado, ela deixou de ser o eixo, e isso desequilibra a pessoa e a estrutura que foi consolidada o casamento.
Não estou aqui pra dar conselhos matrimoniais; quem sou eu na fila do pão que o diabo amassou pra isso?! Me separei no exterior, um processo extremamente doloroso, então não sou um exemplo dessa área.
Mas sou um exemplo do reencontro. Sou um exemplo da persistência do meu ser. Sou um exemplo de pessoa que não quis se ver perdida dentro das possibilidades da vida. E, posso te garantir, a vista daqui, tá bem mais bonita, porque tudo está bem no MEU mundo, pois vivo o meu mundo de acordo com quem EU sou.
